Nestes tempos conturbados, em que tantos clamam anti-semitismo ou anti-islamismo, já sem falar do anti-cristianismo, vale sempre a pena fazer um pouco de publicidade gratuita a quem trata todos os credos com equidistância e relembra a única saída saudável e racional: http://www.ateismo.net/diario/ CL
Gostava de partilhar o entusiasmo do FAL no Corta-Fitas, mas não consigo. Lá continua o Rei dos Frangos com o seu lugar cativo, o Caneira por resolver e um novo inadaptado ao futebol europeu para chegar, o Deivid a atrofiar e El Loco como alternativa ao Liedson. Os miúdos? Quase sem excepção, transferidos ainda em formação, para mal deles e por tuta e meia (cláusulas de rescisão, nem vê-las...). O Guadiana e o seu troféu são passatempos. CL
Nunca faço links para outros sites, blogs, etc., por não ter prestado atenção suficiente quando o George me explicou a arte. Tenho pena. Sobretudo quando a recepção ao que vou escrevendo é maior do que eu alguma vez pensei. Espero que seja este o meu perfil de blogger por pouco tempo mais. Preferia um Auto-Retrato mais completo, como aquele onde vou tantas vezes ouvir música e ler o que lá se escreve. CL
As TV's interessam-se pelo Médio Oriente por ser um bom fornecedor de dramas pessoais, situações de guerra e imagens fortes. E fazem bem, é um negócio de volume e que obriga a manter o público (as massas) fiel a um guião simples de segir mas sempre com possibilidades de reviravolta. Já a excitação nos jornais e blogs em torno do assunto é mais complicada. Aquilo que se vê não é nenhuma preocupação internacionalista (seja com o governo do mundo, seja com o preço dos combustíveis), nem sequer paroquial (as comunidades judaica e árabe portuguesas são discretas). A excitação segue o modelo celebrizado pela grande Fátima Campos Ferreira no seu Prós e Contras: quem está por Israel? Quem está pelos árabes? Mas, como a distância é muita e os efeitos ainda não se fazem sentir no bolso, a coisa evolui para os termos locais: quem é comuna (logo anti-semita)? Quem é lacaio de Bush (logo anti-árabe)? No primeiro termo, Diogo Pires Aurélio, Vasco Graça Moura, Eduardo Pitta; no segundo, Vital Moreira, Louçã e o PCP (aqui coligado com a extrema direita, como se viu bem no Kontratempos). Há quem tente enquadrar a coisa em termos mais interessantes, como Rui Bebiano, António Costa Pinto ou Medeiros Ferreira, mas sem sucesso. O que interessa é animar a malta com uma polémica de Verão (a nossa versão das guerras de Verão de outros tempos) em que o Médio Oriente é apenas um pretexto, como o caso de um abaixo-assinado recente bem ilustra: quem assina não passa (para os primeiros) de idiota útil, esteve calado noutros casos, é, sempre foi e será para sempre, estalinista; quem não assina (para os segundos) quer a crise, a opressão e a próxima Guerra Mundial. O triste é que isto nem sequer é novo. Num livro esquecido de Adolfo Casais Monteiro (O país do absurdo, ed. República, 1975), que estou a prefaciar para publicação nas Obras Completas de Casais, já se notava como a redução da oposição portuguesa a comunistas visava permitir combater todas as oposições e todas as liberdades, não defender qualquer ordem. Casais, que não era comunista nem sequer neo-realista, percebeu bem como o anti-comunismo era apenas uma forma dissimulada (ou implicada) de defesa do regime - o que é natural num país onde o anti-comunismo sempre foi maior do que o comunismo. Onde a anti-liberdade nunca desiste de se vingar das liberdades. A redução quase imediata do conflito no Líbano e na Palestina (na verdade dois conflitos, em que até se pode apoiar Israel num e não no outro) às querelas da nossa Esquerda/Direita demonstra bem como o «anti» (Israel ou árabes, tanto faz) é o espírito perene da nossa incipiente discussão pública. E não surpreende, portanto, que se discuta ao nível do Manuel Germano coisas tão distantes de nós, enquanto se passa em claro as realidades nacionais que só um debate ideologicamente claro poderia mudar. Da justiça à educação, tudo o que se poderia discutir com proveito em termos de Direita e Esquerda só é desejado como objecto de um «pacto de regime». Não se discute aquilo que se pode mudar, só aquilo que a discussão deixará inevitavelmente na mesma. É o pacto de regime do país do absurdo. CL
Hoje, pela milionésima vez, é o dia decisivo para o Sporting contratar Caneira. Entretanto, o anterior reforço da defesa, Moisés, não chega a jogar, por não poder. Do avançado é melhor não falar... ainda se espera o dinheiro do defesa transferido o ano passado, já que exigir garantias bancárias também deixou de ser necessário. Os génios que se cooptam à frente do Sporting são um bom exemplo da incompetência das elites portuguesas. Apresentam-se sempre como salvadores e os únicos sérios, com ar de superioridade sobre os outros. Depois, é isto. Hoje estão todos juntos, o Freitas, o Bettencourt, o Telles, tudo. O resultado é este. Cento e um anos, mais um ano a ver passar navios. CL
O actual revisionismo em torno da Guerra Civil de Espanha tem sido bem criticado em vários blogs, que topam facilmente a agenda ideológica redutora que os move. Na mesma linha, aliás, as tentativas (em O Amigo do Povo) de apresentar não os católicos mas a Igreja Católica como resistente ao nazismo e fascismo. Este revisionismo não espanta, atendendo ao já longo ataque à I República, que em muitos aspectos teve um destino paralelo ao da República espanhola, como depois o viriam a ter as duas ditaduras. É um revisionismo que reduz a questão a uma escolha entre ditaduras (ou Fascismo ou Comunismo), dando de barato o fim do liberalismo «à século XIX» sobre o qual esse combate se travou. Mas onde um Vasco Pulido Valente ainda tem uma noção disto, que usualmente evita mencionar para manter o argumento ao nível mais acessível, os seguidores (Rui Ramos, Luciano Amaral) tendem a esquecê-lo com uma facilidade própria de quem tem por missão provar a sua superioridade face ao «politicamente correcto» (que, no caso, nem sequer verdadeiramente existe; a este respeito, e para o caso espanhol, ver o artigo de ontem de Mário Mesquita no Público). Ora, o fim do liberalismo, a cultura política que definiu a modernidade por toda a Europa mas nunca na Península, é a verdadeira questão. O mais interessante estudo sobre o assunto que conheço é o de António Pedro Mesquita (O Pensamento Político Português no Século XIX, INCM, 2006), e ainda ontem na revista Pública, em entrevista a Nuno Gonçalo Monteiro, a relevância do tema foi salientada. O relativo sucesso do pensamento liberal em Portugal e em Espanha na viragem do século XIX para o século XX (e há variações relevantes entre os dois países) não foi comparável ao que se verificou na Europa ocidental, e com naturalidade encontramos na vida intelectual e política de ambos os países uma oposição entre «castiços» e «estrangeirados» (uso os termos de Portugal) que marca bem a conflitualidade entre isolacionistas e europeístas. O conflito entre comunistas e fascistas não podia ter na Península o mesmo significado que tinha na restante Europa ocidental por não haver deste lado dos Pirinéus a mesma modernidade. Mais do que um combate entre visões extremadas da modernidade como foi noutros países, o combate ibérico foi entre os que tentaram a modernização de sociedades tradicionais (e houve-os em ambas as repúblicas) e os que quiseram superar (comunistas) ou destruir (fascistas) essa modernidade. Isto são tipos-ideais, na verdade houve quem mudasse de lado, e por isso o melhor é ver os casos concretos. Em Portugal o caso de Fidelino de Figueiredo merece atenção, em Espanha, o de Ortega já a vai tendo. Trata-se de diferenciar, não de amalgamar, e a crise ibérica do liberalismo teve mesmo interesse europeu – justamente por causa da Guerra Civil. CL
1. O caso Júdice é já uma novela demasiado má. É triste ver quem se diz liberal falar das instituições a que pertence do modo como Júdice tem feito. E isto nem sequer é em abono da Ordem, que me é estranha. É sim pelo modo ressentido como os derrotados na última eleição para o cargo de Bastonário se comportam publicamente desde então. 2. A condenação dos dois sindicalistas que não sabem falar em público parece suspeita, quanto mais não seja pela invulgar celeridade. Mas a vitimização dos condenados é ainda mais suspeita. 3. Bom artigo, hoje, de António Costa Pinto no DN. Convém não confundir o conflito no Líbano com o da Palestina, apesar de haver intervenientes em comum. Mas o papel de cada um no «teatro» muda mesmo muito. CL
Os «tall ships» no cais Rocha Conde de Óbidos não são muitos nem muito impressionantes, mas quem gosta de navios não perde em ir. A recepção oscila entre o mal educado (tenda vip e arredores) e o prestável (segurança), a organização é fraca (vendem canecas, mas não bonés) e o estacionamento será cada vez mais impossível (e confuso). Só até Domingo. CL
O episódio Bush&Blair subrepticiamente gravado e noticiado como uma «notícia» não teve, felizmente, especial destaque. Na verdade, Bush limitava-se a dizer em vernáculo aquilo que dois dias antes, ao lado de Putin, tinha dito diplomaticamente. Mas é claro que não foi por isso que o caso não foi demasiado explorado, foi por o assunto ser demasiado sério para ser desviado para uma minudência como aquela. A realidade não se reduziu a uma mensagem tão abastardada, não por culpa de spin doctors mas por escolha editorial. Como diz no Kontratempos Tiago Barbosa Ribeiro, é de uma (falhada) degradação da cobertura jornalística que se trata. CL
O artigo de Medeiros Ferreira publicado hoje no DN é revelador de uma visão estrangeirada da cultura e sociedade portuguesas no século XX. O autor chega a referir-se ao seu passado de exílio, uma das formas de «estrangeiramento» mais relevantes na história portuguesa. A valorização da acção modernizadora, europeizante, da Gulbenkian em Portugal deixa passar em claro, contudo, um problema que a visão estrangeirada por regra não discute (já Borges de Macedo o notou, em 1974): como influencia a sociedade portuguesa esses esforços europeizantes? Nisto, há todo um conjunto de problemas: qual a coerência desses projectos de modernização inspirados na Europa (grande no caso da Gulbenkian, isso parece claro), quais as relações estabelecidas entre os agentes proponentes da modernização e as instituições do país, etc., etc. No caso da Gulbenkian, a crítica mais frequente é a do seu fechamento. Justa ou não, merece consideração. A Gulbenkian não resistiu ao «Portugal histórico»? Mas esta não é uma pergunta para fazer na festa, esperemos pelo anunciado livro. CL
A situação no Médio Oriente está tão extremada que até George W. Bush conseguiu fazer figura de estadista ao falar sobre o caso em S. Petesburgo. Sobre o assunto, apesar do (meu) atraso, merece ser lido o post de Rui Bebiano «A desgraça árabe» (no blog A Terceira Noite). O atraso é o menos, há problemas que não conhecem solução. Oslo já lá vai, e do pobre «road map» já nem os seus proponentes falam (esses génios que diziam ser Arafat o maior obstáculo à paz e Saddam a grande ameaça...). CL
No relambório sobre a crítica, A. M. Seabra escrevia a dada altura que a área de ciências sociais do Mil-Folhas está muito fraquinha. Hoje, o livro de Pulido Valente, já objecto de crítica e de entrevista ao autor no jornal, é criticado por Eduardo Pitta. Prova de que Seabra tinha razão? Não, até da disjunção entre crítica de ciências sociais e crítica literária eu discordo. Mas sugestivo, em todo o caso. O público dos livros de Pulido Valente não é o que se interesse por História mas por romances. A editoria foi judiciosa em não tratar o livro como ciência. E o crítico provou que sabe do seu ofício. De novo, mas suspeito não pela última vez, a crítica não morreu, mudou de função. CL
Não, não é um post sobre o festival erótico na FIL. Só uma dúvida que regularmente me assalta, agora a propósito da entrevista (ontem) de Maria João Avillez a José Sócrates: por que motivo as entrevistadoras televisivas deste país são todas tão más? Exagero? A meu ver o único sinal de racionalidade neste problema das mulheres entrevistadoras foi dado pelos terríveis espanhóis que compraram a TVI para dar cabo dos valores lusitanos que esta tão bem cultiva(va), quando puseram fora do ecran a horrorosa Moura Guedes. Mas basta pensar nas outras: a Marante, a Avillez, até - o George que me perdoe - a Constança. Tanto vazio e peneiras tão hipercompensado com trivialidades e má educação. Sócrates, ontem, teve de se conter. E as «culturais»? A soporífera Sousa Dias, a vulgaríssima Ferreira Alves e a tonta Mota Ribeiro? Querem mais triste? Bem sei que em alguns casos há explicações lógicas, como a «gentrification» da Bárbara quando se juntou ao então ministro da Cultura, similar a um caso mais recente, aliás. Bem sei que também há muitos jornalistas péssimos. Mas o ponto é outro: jornalistas, entrevistadores, comentadores, etc. no masculino há óptimos e péssimos; no feminino, o péssimo predomina de tal modo que parece ser o único que tem procura. O destaque a dar às mulheres depende de reproduzirem o pior dos homens? O irónico é que as aterantivas seriam boas, mas andam desperdiçadas em horários impensáveis (como Fernanda Freitas, que apresenta um programa no canal 2 às 14h dos dias de semana) e em funções anódinas (Teresa Pina, na SIC Notícias). Mesmo assim há excepções à regra, como Clara de Sousa? Sim, mas não devia chegar. CL
Ainda sobre o post de ontem, de certo modo, é nítido que o debate sobre o próximo referendo, à despenalização do aborto, já começou. Pelo menos entre blogs. Misturado com o que nada tem a ver com ele, desde o fundamentalismo religioso e respectivo terrorismo até às visitas papais, mas já começou. Em termos não muito auspiciosos, mas tem a virtude de não esperar pelas decisões políticas. Tal como a lei de procriação medicamente assistida mostrou de novo, pouco depois do que se viu com o magno problema do protocolo de Estado, e se voltará a ver a respeito de coisas tão diversas como o casamento ou a adopção por casais homossexuais, em tudo se joga a influência social da Igreja. Ou melhor, influência política. E a despenalização do aborto, ou falta dela, é «apenas» o seu principal símbolo. Mas convém não ter muitas ilusões: quando o perder, a ICAR inventa logo outro. CL
O PR promulgou ontem a lei sobre a procriação medicamente assistida, apesar dos «movimentos» e das propostas de referendo em desespero de causa (aqui referidas a 26 de Maio). Curiosamente, e admito que não pesquisei muito (blogs não são o meu forte), além do que fica aqui no Esplanar, só no Da Literatura (graças a Eduardo Pitta) se parece acompanhar o caso. Tem piada, por razões bem diversas a lei é-nos (directamente) indiferente. Agora falta saber como fica a paridade das listas eleitorais (ontem num forum radiofónico um participante dizia «hoje no Parlamento, amanhã na construção civil»...), mas a expectativa é justificadamente boa. CL PS - Hoje, no Público, Rui Ramos refere-se a Pacheco Pereira desdenhosamente sem escrever o seu nome. É uma escola muito portuguesa, ainda recentemente Pulido Valente tinha feito o mesmo a Ramos, a propósito da sua biografia de João Franco. As excelências não dizem lá, nem cá, nem nada. Eis as «elites» portuguesas...
Bom artigo de Medeiros Ferreira no DN de hoje. Mesmo engrandecendo Freitas e enaltecendo a sua própria clarividência (que, no caso das últimas presidenciais, foi mais do que dúbia), Medeiros Ferreira traz uma memória e, em certos aspectos, um enquadramento históricos que habitualmente faltam no debate público (não só no jornalismo, não só na política) em Portugal. CL
Só um postal para te dizer que o Seabra acabou o serviço fúnebre da crítica. Não respondeu a nenhuma das três perguntas que começou por declarar fulcrais, nem passou nunca do nível da denúncia, versão «elenco das minhas inamizades actuais». Material não lhe falta e a desvergonha editorial local ajuda-o, claro. Na última prestação voltou a referir-te, a propósito da queixa da senhora do nome registado. Como combinado, está tudo guardado à espera do teu retorno. Grande será a tua decepção com o autodenominado «ensaio» que não ensaia ideia nenhuma, incapaz de pensar o que quer que seja de definido sobre a crise que não se cansa de anunciar (por não se aperceber que uma crise constante é uma contradição em termos?), parece o Guerreiro com a história da morte do Romance... Enfim, já ninguém presta atenção, cá vamos andando com a selecção a festejar e toda a gente a festejar com ela. Ou quase. Ciao CL
Hoje o Público faz manchete com o facto de Soares ter garantido aos EUA, há mais de 30 anos, que Portugal não se tornaria um regime comunista. É oficial, estamos na silly season. CL
Termina este fim de semana e, como era de prever, não saímos vencedores. A avaliar pelas reacções, nem o que serviu a Eusébio é suficiente para os nossos «heróis». Mas não foi um Mundial inútil. Mostrou o que não mudou e o que talvez esteja a mudar. O que não mudou foi o habitual desperdício dos avançados portugueses em extremos. Cristiano Ronaldo fez toda a sua formação como ponta-de-lança, chegou aos seniores assim (quando Jardel fez greve) e, quando Fernando Santo dizia apostar nele para a função, foi para o Manchester jogar na ala. Na selecção assim continua, mas não tem avançados para ganhar bolas pelo ar e dá no que dá: em três jogos de «mata-mata», 1 golo marcado (e pela relva...). Nisso repete Figo, um dos médios mais goleadores de Portugal até ir para a ala do Barcelona cruzar. Deixou de cabecear e, 11 anos depois, falhou o golo que o levava à final... Clubes como o Barcelona e o Manchester podem desperdiçar nas alas «matchwinners», mas Portugal não, não tem alternativas. Se Cristiano jogasse como Henry (e bastava trocar Pauleta por Simão), jogaríamos como a França e ele teria ganho um penalty como fez o francês. Mas não, estava na lateral. Se Figo jogasse no meio, onde fez melhor figura neste Mundial por não sofrer da sua actual menor velocidade, não saíria derrotado por Zidane. Deco? Que jogasse mais recuado, como no Barcelona. No futuro imediato, pós-Mundial, Portugal pode jogar como a França. Mas também como a Alemanha, com Ronaldo no papel de Podolsky e alguém mais fixo e/ou mais experiente «a fazer de Klose». Nas costas, retirado Figo, há Quaresma (ou Nani), que Scolari em tempos comparou (e bem) a Denilson. Simão é melhor quando sai do banco, já se sabe. Mas algo me diz que vamos continuar a jogar com os que decidem longe da baliza, a cruzar bolas para as defesas dos outros... O que talvez esteja a mudar é a mania das culpas. Ainda há quem culpe o áritro, mas já se vê como não convence a maioria. E é bom ver Ricardo Carvalho, sempre tratado como se fosse infalível, reconhecer que fez falta (viu-se que foi sem querer) e não se lamuriar pelo justo cartão que viu. Essa é a nossa verdadeira pequenez, a que procura sempre desculpas para o nosso futebol inconsequente na hora da verdade (até quando é contra os insignificantes gregos, como há dois anos). Mesmo se no passado merecíamos mais a fama de «mergulhadores», que sempre apreciámos muito («ratice», «saber», «experiência», «manha», tudo coisas lindas, para os «analistas de futebol»). Se hoje mostrarem querer ganhar isso será mais importante do que aquilo que não mudou, mesmo que os alemães acabem em terceiro. Verdade seja dita, é o mais provável. E amanhã torço pela Itália, claro. CL PS - Subscrevo o post do Corta-Fitas: a lei do fora de jogo é fonte de problemas, não resposta a eles. PPS - E como eu gostava que alguém viesse a Alvalade contratar um dos três melhores guarda-redes do Mundial...
Sobre o público que se criará, ou não, conjuntamente à alternativa que a net pode ser aos meios de comunicação dos últimos três séculos, aquilo que (me) parece mais problemático é algo que se detecta logo em quem escreve, e que é contrário ao tempo de discussão (não distanciação) próprio do trabalho crítico: um predomínio da sensibilidade sobre o intelecto. Um aspecto evidente disto, e com o qual simpatizo sem reservas, é a música rock, ou pop, como se preferir. A presença da própria música e de referências mais ou menos claras a ela nos blogs é uma marca geracional, mas é de crer que terá mais importância do que apenas essa. Neste momento, o que se nota é o falhanço de tentativas de aggiornamento cultural da Imprensa para a net (caso de Pulido Valente), quando não de simples abdicação (Prado Coelho), e a fronteira pode bem ser traçada na capacidade de sentir, ou não, a música rock como algo natural, como «a nossa» música. De um modo geral, para quem está hoje acima dos 40 anos isso não é possível (há excepções, como o Rui Bebiano). Quem espera criar na net uma alternativa e a «next big thing» pode ver nisso uma prova de o futuro passar por aqui. Mas a cultura pop, muito mais do que sucede com a boa música rock, é sobretudo imagem, avessa ao discurso, crítico ou não. Mesmo quem não seja catastrofista no que respeita «ao estado a que o ensino chegou» não pode deixar de pressentir aqui uma dificuldade para veículos de texto, como os blogs, poderem criar um público diferenciado das massas que procuram entretenimento. E mais ainda para quem queira fazer dos blogs os sucessores das funções intelectuais anteriormente reservadas à palavra impressa. Como ficou escrito na primeira parte deste post, não será impossível fazer num blog uma «visão do mundo» digna desse nome (embora seja muito complicado); mas ainda mais difícil será conseguir criar um público para ela. A menos que se crie não um novo público pela via intelectual mas pela sensibilidade. Ou melhor, por uma nova relação entre as duas. Mas a «relação» é uma categoria muito complicada, como os intelectuais impenitentes devem saber. CL
No Corta-Fitas, há poucos dias, um post em duas prestações observava a falta de intelectuais na Imprensa (e comunicação social em geral) e a falta que fazem. Permito-me discordar pelos motivos que já escrevi, aqui mesmo, há algumas semanas (em «A crítica não morreu, mudou de função»). Mas tem interesse a ideia de «falta de intelectuais», ela dá ao tema da alternativa que os blogs representam à comunicação social algo valioso, aliás herdado da Imprensa, a função compreensiva da comunicação; isto é, atribui aos blogs a possibilidade (e a conveniência) de dar uma «visão do mundo» complexa, articulada e autocrítica. Nela, a edição escolhe e relaciona o que é dado a ver/ler com sentido, cumprindo assim uma função de mediação social. Ainda ontem, numa reportagem da SIC, dizia-se que este ano será o do video na net, com a aposta dos industriais do ramo a cair na comercialização de webcams; faz sentido, os blogs já começam a perder espaço para os V-logs, videologs, de acordo com a norma de a imagem substituir o texto, sobretudo se a imagem estiver em movimento. Assim, com a relativa obscuridade a envolver os blogs, em parte obsoletos se atendidas as possiblidades da técnica, pode dar-se o caso de o lixo anti-intelectual presente neles desde o início ser vazado para a nova moda videológica e, com isso, o discurso crítico ganhar neles uma preponderância até aqui impossível. Eu não acredito, mas pode ser. Só que isso não resolverá a questão do papel dos blogs e da sua influência (aliás quase sempre discutida de modo inteiramente superficial, mesmo onanista). A mediação a promover nos blogs implicará o contrário do aforismo (tendencialmente críptico) e do diarismo (tendencialmente subjectivo), ela terá de cumprir aquilo que antigamente se chamava «linha editorial», sem necessariamente envolver nisso um compromisso ideológico. Mas requer uma «visão do mundo» feita da articulação daquilo que se escolhe e se destaca. Como um livro de Nietzsche, que não se lê aforismo a aforismo, mas no seu conjunto. Contudo, isso significa criar um público, e não apenas escrever entre blogs. Um novo espaço público, como o que os media modernos criaram e que entretanto foi convertido em espaço de entretenimento de massas. Como as experiências de interactividade com o público nunca alcançam o sucesso pretendido, talvez seja correcto partir do princípio que o público dos blogs tende a ser passivo (ou anónimo, o que é ainda pior). Pelo que o problema é o de criar esse público, desde logo com hábitos de leituras que não sejam os de SMS que se escrevem automaticamente... Continuo amanhã, mas não resisto (até por este ser um tema fundamental do pensamento liberal) a recomendar leituras a quem julgar que as oposições de Pacheco Pereira entre «Estado mínimo» e «Estado máximo» servem para alguma coisa que não seja da ordem (pobre Freud!) «pulsional»: Francis Fukuyama, A Construção de Estados (Gradiva, 2006). Só o primeiro capítulo basta para explicar o motivo pelo qual o liberalismo não é só gritar «liberdade, liberdade», como se esta se fizesse à custa do Estado e não em relação com o seu âmbito e a capacidade para cumprir as suas funções dentro desse âmbito. E mais não digo, por ir publicá-lo na Prelo nº2. CL
Eduardo Pitta, no Da Literatura de hoje, diz-me «de pousio». Por mim, e (suspeito) pelo J. P. George, não me acho de pousio. George publicou há meses uma recolha de textos da crítica que regularmente faz. Eu escrevo sobre o que vou lendo onde a crítica é viável, ou seja, em revistas de cultura e académicas, portuguesas e não só, em Português e em Inglês; não em dossiers de jornais feitos em resposta aos «envios» das editoras. Estas, aliás, não menosprezam isso, a quantidade de informação que chega ao Esplanar a respeito de lançamentos é significativa (imagino que a que chega ao Da Literatura também seja). Mas a lista de 15 nomes apresentada por Pitta deixa muita gente de fora: para falar só dos de filosofia, André Barata, Pedro Galvão, João Tiago Proença... Este último também não está de pousio, escreve na Prelo a meu pedido. O mesmo poderia dizer de Pedro Galvão e do maior esquecimento de todos, Miguel Real (António Guerreiro terá começado quando, aliás?). Mas não digo. Num post ou num «trabalho académico», ver a crítica pelos criticos, «novos» ou não, é deixar de fora o que a define (um modo de discurso) e focar as supostas personalidades, entrando no caminho das tricas e das fantasias sobre «círculos», «génios», etc. e tal. A crítica é, e daí dirigir a Prelo ser tudo menos estar de pousio, muito mais edição do que escrita, o resto é conversa fiada sobre novidades, choques geracionais, e coisas vazias que tais. E não é um «trabalho académico» sobre menos de 20 anos de crítica que lhe dá consistência, pelo contrário, demonstra sim a inconsistência do tema, desde logo no período escolhido (a propósito: Gaspar Simões deixou a crítica nos anos 70, e já estou a ser bondoso; só por inépcia e espírito burocrático se pode pensar que o crítico morreu só com a certidão de óbito do cidadão). Mas dois posts recentes de Luís Naves no Corta-Fitas, sobre jornalismo, dão matéria para pensar nestes temas de modo mais relevante. Fica para a próxima. CL
A diplomacia preventiva do nosso embaixador em Paris, a ser verdade que vai apresentar queixa formal pela agitação anti-portuguesa antes da meia-final do Mundial, é boa diplomacia. Para quem pensa que o futebol nada tem a ver com política «de Estado», fica a observação: por estes dias, nada como os resultados dos jogos pode gerar tantos e tão graves crimes espontâneos. E sorte temos em o Brasil ter sido eliminado, nos «bairros típicos» de Lisboa o habitual ódio ao brasileiro já estava muito acicatado com a possibilidade de um jogo com o escrete. Cá como em toda a parte, o «fair play» é como todas as coisas muito faladas - pouco praticado. CL
O post de hoje na Memória Inventada, sobre as polémicas que há e as que não há, só peca por dois motivos: há vários sítios onde se faz essa polémica como qualquer outra (aqui no Esplanar, por exemplo); e os diferentes grupos (escritores, jornalistas, universitários) são apenas subconjuntos do mesmo conjunto. Mas nem chega a ser curioso querer polemicar sobre o caso e ignorar o evidente, em Portugal é o costume. CL
Imagino que a entrevista de hoje a Vasco Pulido Valente, no DN, ocupe muitas atenções, até por ser muito melhor do que o truque de propaganda do colunista do jornal feito pelo Público. Aqui, o livro não é apenas um pretexto, é a razão de ser da entrevista. E sempre ficamos a saber que VPV planeia escrever o seu próximo livro sobre os séculos XIX e XX da política portuguesa. Fica o registo: quando publicou Glória disse (Público, noutra entrevista) que o seguinte seria um ensaio sobre metodologia da História... Por outro lado, bem mais interessante, o artigo de Pedro Magalhães no Público de hoje, sobre a fraca fiabilidade das previsões dos especialistas, é bem mais sério e pertinente, até por vir de um especialista. Sobre o tema, vale a pena procurar também Public Intellectuals, de Richard A. Posner (Harvard U. P., 2001). Chega a ter mais graça que as bojardas do Pulido Valente. CL
Confesso que, para variar, concordo com a escolha editorial jornalística: o Mundial é bem mais importante que a remodelação. Freitas, como qualquer MNE, não decidia coisa nenhuma, e o Mundial mexe com as expectativas e os hábitos do país todo. Por isso mesmo a remodelação foi anunciada agora, para não parecer mais importante do que (não) é. Nada muda, até o Prof. Marcelo se volta a enganar, como de costume, depois de prever que Seixas da Costa ocuparia o MNE após a presidência portuguesa da UE... Só uma observação: ao contrário do que FAL escreveu no Corta-Fitas, Severiano Teixeira está agora no seu terreno; no segundo governo de Guterres é que esteve adaptado à Administração Interna, depois de no primeiro ter estado à frente do Instituto de Defesa Nacional (salvo erro), e de, entretanto, ter continuado a sua carreira universitária em História e Relações Internacionais em torno de questões de identidade e defesa (sobre as quais escrevia regularmente no DN). Mas isto é um pormenor, claro. Tanto a Defesa como os Negócios Estrangeiros não dispõem de real autonomia política e, em rigor, só estranho ninguém se perguntar se não seria melhor fundi-los num só Ministério. Pensando bem, é até boa altura para Freitas sair, depois da sua inspirada sugestão de se criar uma competição futebolística euro-árabe para resolver conflitos pendentes. Siga o Mundial. CL