Estou com medo. Estou nervoso com o país que está a chegar. Já não me interessa a maioria enjoativa e absoluta dos socialistas, já me passou o desgosto de uma direita destruída e escangalhada. Neste momento só há uma ideia que me atormenta: António Vitorino, a eminência parda do PS e do futuro governo; Marques Mendes, provável dirigente dos social-democratas. Valha-nos Deus! A altura destes homens. Põem-se em bicos de pés para um “habituem-se!” à comunicação social ou anunciam a sua candidatura à liderança do PSD e os microfones ficam à altura da boca e não do peito. Assustador! São pequenos, baixinhos, minorcas, minúsculos, nanicos, olham para cima para falar com a mulher, parecem ter muito menos de 1 metro e 55. Juro que isto me angustia. Até porque já estava na altura dessa Isabel Figueira aí de baixo desaparecer do cabeçalho deste blog. Foram escolher uma fotografia de uma gira mas vestida de gaja vulgar de uma secundária do Linhó. Tudo isto é deprimente.
José Gil é o convidado do próximo «É A CULTURA, ESTÚPIDO!», que vai ter lugar hoje, 16 de Fevereiro, às 18.30h, no Jardim de Inverno do Teatro Municipal São Luiz. José Gil falará sobre o seu livro «Portugal Hoje: Medo de Existir» (Relógio d'Água), numa conversa conduzida por Anabela Mota Ribeiro e com participação activa dos restantes membros da equipa: Nuno Costa Santos, Pedro Lomba, Pedro Mexia e José Mário Silva (Daniel Oliveira está ausente na campanha eleitoral e João Miguel Tavares em Berlim, no Festival de Cinema). Como sempre, Ricardo Araújo Pereira apresenta a sessão e assina o stand-up final.
Na constelação moral da América dos anos 50, a América contra a qual «Rebel without a cause» foi arremessado, Kinsey percebeu que a única forma de acabar com o preconceito era mudar o conceito. Mudar o que se entendia por «normal», mudar o âmbito de «normalcy». Como? Equacionando-o com o «normal», no sentido de ser «comum». E o que era o «normal»? Ninguém sabia. Descobri-lo, expô-lo, passou a ser a tarefa da sua vida. Opor o descritivo ao prescritivo, opor o «como as coisas são» ao «como as coisas deveriam ser». Esse trabalho, obsessivo e quase insano, teve, nesta medida, um impacto emancipatório cuja importância é difícil exagerar. O que o filme não explora a sério é a forma como Kinsey acabou por transformar o descritivo num novo prescritivo, reproduzindo, em simétrico, o exacto mecanismo que visava contrariar. Kinsey criou um «dever ser» novo, agora supostamente espelho do «como as coisas são». E, de passagem, assumiu para si o papel, self-styled, de apóstolo desse novo moralismo, uma espécie de «Pide bom». Uma tirania das fórmulas como qualquer outra, tão má – nomeadamente – como a do seu pai, o «Pide mau». Rui
You're poised to run. You've got time and stealth on your side. Time favors runners. Their tracks dissapear. You can't tell how they hid before they vanished. You don't want me to know. Your secret life was designed to shut certain men out. You ran from men and to men and cut yourself down to nothing. You possessed runner's guile and wore runner's camouflage. Your runner's passion killed you. You can't run from me. I ran from you for too long. This is where I force a runner's confrontation. It's our time now.
[James Ellroy, My Dark Places, Arrow, 1997, p. 204] Rui
Soa o gongo para o início do combate. O pugilista do PS começa logo ao ataque desferindo uma potente série de socos cruzados: “o dr. Santana Lopes tentou aproveitar uma onda de boatos contra mim...” Santana, por seu turno, joga em deslocações constantes, evitando o corpo-a-corpo: “quando a verdade é verdade ela impõe-se a todos os boatos”. Sócrates lança depois um gancho em looping: “Não venha com essa desculpa, você confunde tudo...” Santana resiste com esquivas milimétricas e responde com um jab de direita: “em Abril de 1996, em período de governação do PS, Portugal atingiu os níveis máximos de desemprego”. Sócrates dobra os joelhos, vai ao tapete mas vence a contagem de protecção do árbitro. Determinado, o pugilista do PS desfere um murro no fígado, uma obra-prima do género: “Não peçam a um socialista para virar a cara para o lado quando existe pobreza em Portugal...”. Santana vai à lona e apresenta um ligeiro corte no sobrolho direito. Já recuperado, ágil como uma serpente, dirige-se ao adversário de punhos fechados e lança uma sequência de uppercuts: “as pensões mínimas vão ser equiparadas ao salário mínimo, O Estado vai poupar 150 milhões de euros, o défice vai ser controlado.” Encurralado num canto, com a vista turvada, embaciada de lágrimas, Sócrates atira uma “bomba” de esquerda que quase arruma ali a contenda: “Eu vou criar 150 mil empregos e vou aumentar os salários dos funcionários públicos...” “E eu não vou aumentar os impostos”, contra-ataca o pugilista do PPD/PSD, encurtando os espaços e desferindo uma direita rectilínea. Um argumento demagógico pode ser tão demolidor como um gancho esquerdo de Lennox Lewis e uma falsa promessa tão arrasadora como uma direita rápida de Evander Holyfield. A verdade é que o debate não foi assim. Isso eram outros tempos. Acabaram-se os pesos pesados na política portuguesa.
O político em campanha eleitoral é, por excelência, um gritador. Como o missionário no púlpito, o político distingue-se pelo vozeirão e pelo dedo indicador a mover-se como um cutelo.
As fúrias verbais do capitão Haddock são compêndios de insultos. Deixo aqui alguns, que os líderes políticos poderão sempre utilizar: rizópodos, ectoplasmas, coleópteros, equinodermes, protozoários, colocíntidas, zigomicetes, zapotecas, ornitorrincos, macrocéfalos, anacolutos, hidrocarbonetos, vendedores de tapetes, tocadores de gaita-de-foles, escolopendras, espécie de iconoclastas míopes, fanfarrões de orquestra, saltimbancos amestrados, lagartos desmontáveis, espécie de logaritmos, astronautas de água doce, espécie de selvagens interplanetários, ratos neurasténicos, autodidactas preparados com molho tártaro...
Vão dar o nó. Mau maria. Então como é que é? Se é para serem iguais às outras pessoas, então não vale a pena a monarquia. Sim, que isso de pagar impostos é o mais fácil. Difícil, difícil mesmo, era resistir a casar com Camilla, e vice-versa. Rui
Nestas eleições decidi tornar-me um cidadão responsável: fui ler os programas eleitorais de todos os partidos políticos. Nunca me considerei particularmente informado em questões políticas e, se é verdade que sempre votei (o que faz de mim um possível candidato a futuras eleições presidenciais), a minha ignorância das ideologias, da situação da fazenda portuguesa, dos manejos dos partidos ou da folha de serviços dos ministros chegava mesmo a ser escandalosa. Por exemplo, até há relativamente pouco tempo confundia o BE (Bloco de Esquerda) com o outro BE (Banco de España) e, pior, o PCP com o BCP. Uma vergonha!
Hoje sou uma pessoa diferente. Tenho 32 anos e posso dizer, sem hipérbole, que me sinto, pela primeira vez, optimista em relação ao futuro e ao lugar de Portugal no mundo. Basta ler os programas. Todos eles nos garantem que seremos felizes para sempre, que o paraíso terrestre está à distância de uma pequena cruz no boletim de voto. Consultar os manifestos eleitorais é quase como esfregar a lâmpada de Aladino: “Eu sou o vosso servidor. Fala, que desejas?”. Aumentar as receitas fiscais, sanear as contas públicas, reduzir o IRS, acabar com a evasão e a fraude fiscais, aumentar o investimento nas tecnologias, na investigação científica e no desenvolvimento sustentável, fazer crescer as exportações e o investimento estrangeiro, diminuir os custos da justiça, desburocratizar a administração pública, reduzir a sinistralidade, internacionalizar a cultura portuguesa, modernizar os museus, em suma, fazer de Portugal um dos 20 países mais competitivos do Planeta.Somados, os programas dos partidos totalizam 641 páginas (incluí, para que depois não me acusassem de desigualdade e discriminação no tratamento das diversas candidaturas, os programas do PCTP e do MPT). Foi uma leitura estimulante, épica, mais ou menos como ler de jacto o último livro de António Lobo Antunes, Eu Hei-de Amar uma Pedra (616 páginas). Todavia, ao contrário deste último, os programas eleitorais apresentam-nos uma escrita inspirada, desassombrada, com achados de estilo, como “futuro credível”, palavras sonoras, como “terricídio”, verbos inovadores e moderníssimos, como “implementar” ou “agilizar”, figuras de estilo com a ironia sempre pronta, como “tudo nos é oferecido numa bandeja de ilusões”. Enfim, na concepção dos pormenores, nas intervenções cómicas, nas sensações extremas, na imaginação desenfreada, estes programas fazem-nos lembrar livros como Utopia, de Thomas More, ou O Elogio da Loucura, de Erasmo de Roterdão.
Eric Roberts é uma figura fascinante, não sendo, repare-se, um actor que me fascine. Para começar, é um homem que, de tão parecido com a irmã, se torna feio. Já está. Este é exactamente quanto tempo se consegue falar de Eric Roberts sem falar da sua irmã, Julia Roberts: nenhum. Eric Roberts vive na carne o drama que Daniel Auteuil vive no celulóide, em «Ma saison préférée». Se ser irmão de Julia Roberts é difícil, sê-lo de Catherine Deneuve é devastadoramente perturbante. O que tem faltado a Eric na vida é um Techiné que o saiba mostrar e, desavergonhadamente, explorar. Faz filmes de acção, com muita porrada. A maior parte dos papéis para que é escolhido são, adequadamente, para esquecer, e eu esqueci. No seu melhor, chega a ver Tommy Lee Jones lá ao fundo; no seu pior, consegue ser pior que Steven Seagal. O problema de Eric não é ser um canastrão, é ter pretensões. Veja-se, por exemplo, o filme que o canal Hollywood passa hoje e que se chama «Festa de despedida», e há outros. Eric supõe que enquanto fizer de canastrão nunca deixará de ser «o coitado do irmão de Julia Roberts». Correcto. Supõe também que a melhor maneira de se emancipar da irmã é tornar-se um autor. Incorrecto. Como Charlie Sheen e Emílio Esteves mostram, a melhor maneira de dois irmãos se emanciparem não é fazerem filmes artsy, é não usar o mesmo nome. Depois, Stallone escreveu e protagonizou o primeiro «Rocky» antes e não depois de «Rambo». Relembro que «Rocky», filme independente e de autor, ganhou os Oscares para melhor filme, melhor montagem, e melhor realização e que Stallone foi nomeado para melhor actor e melhor argumento (parece que Stallone escreveu o argumento em três dias; não se estranhe por isso a autobiografia de Alexandre Frota). O problema de Eric não é ser um mau actor (algo em que poderia chegar a ser bom), o problema é achar que isso não chega; que não lhe chega ser o irmão feio e sem talento de Julia Roberts.
Rui
Mario Benedetti ensinou-nos que a culpa não é nem dos pretextos, nem do tempo, mas daquele que não se faz enamorar. Benedetti falava do amor entre pessoas. Os partidos, como se sabe, são como as pessoas, mais exactamente, como as mulheres. Para que as relações entre eles vinguem, os partidos têm que saber fazer-se desejar.
Vejamos o PC. O PC não sabe. Todos os dias o PC diz que está disponível. Isso é não saber. O PC parece uma velha desdentada de perna aberta; sucede que desejo não é exactamente o que velhas desdentadas de perna aberta inspiram. É por isso que ninguém lhe vai pegar. A ideia de que no dia 20 de Fevereiro à noite José Sócrates vai bater à porta da Soeiro Pereira Gomes de sapatinho na mão para ver se serve no pezinho de Jerónimo é pura fábula. Jerónimo é uma abóbora e abóbora permanecerá para sempre.
Com o Bloco o jogo é outro. Como alguém dizia, «no balls, no babies». O Bloco é uma menina diferente, daquelas que fazem género, mais exactamente o género difícil. Diz todos os dias que não está disponível. Aprendeu bem a lição de Benedetti e não esqueceu nada. Sabe, por isso, fazer-se desejar. Para o governo não vai, acordos parlamentares talvez. Faz lembrar as pressurosas meninas da Opus Dei que, por não entregarem nunca a virtude, só fazem fellatios, em compensação.
Filipe/Rui
Reparei hoje que o leitor Carlos F. J. Sampaio endereçou uma carta, mais uma, ao Público, intitulada «Notas de Campanha». Confesso que estes leitores me fascinam. Eu gostava de saber, de pessoas como Carlos F. J. Sampaio, Augusto Kuttner de Magalhães ou A. João Soares, para referir apenas alguns dos mais conspícuos, eu gostava de saber, dizia, o que fazem, onde vivem, o que lêem, se pagam impostos, enfim, se gostam de João Pedro George. Gostava que o «Zapping» ainda existisse, mas só por causa disso. Aparentemente, dado já escreverem cartas denominadas «Notas de Campanha», já para não falar da periodicidade com que o fazem, estes leitores têm de si próprios a imagem, de todo não desadequada, de cronistas do jornal que lêem. Eles são cronistas sim senhor, tanto quanto o são Barreto, Prado Coelho ou Helena Matos. Eles já escrevem como os cronistas (ou pelo menos usam-lhes os títulos), eles escrevem, até, com maior regularidade que os cronistas, com a excepção dos da Capital. Ora, esta última observação sugere a possibilidade de Carlos F. J. Sampaio, Augusto Kuttner de Magalhães e A. João Soares serem heterónimos de jornalistas do Público, que vêem assim ampliado o seu espaço para opinar. Será Kuttner Ana Sá Lopes? João Soares Eduardo Dâmaso? F.J. Sampaio Bruno Prata? Ou serão heterónimos colectivos da redacção? É uma possibilidade a não descartar. A verdade é que há muito tempo que esses nomes são sempre os mesmos, como na Bancada Central, como no Fórum da TSF e no Canal SMS e que, como na Bancada Central, no Fórum da TSF e no Canal SMS, são uns chatos.
Um vosso leitor atento,
Rui
Ciclicamente deito fora CDs e livros. Não se trata de imitar o Vasco Pulido Valente: esse compra os livros só pelo prazer de os deitar fora. Eu deito fora livros e CDs porque simplesmente não tenho espaço para tanta coisa. É com profunda tristeza que me desfaço de um Liberal Purposes, do Galston, ou de um Post-Orgasmic Chill, dos Skunk Anansie. Desta vez mudei de táctica, e pus esta dolorosa tarefa a render: fui à Daily Price vender vinte CDs. Fiz uns míseros vinte cinco euros, mas foi reconfortante saber que, «por excesso de stock», os Walkabouts valem hoje em dia 0.50 euros. No final do leilão, o empregado da loja perguntou-me se eu queria receber em dinheiro ou em compras na Daily Price. Optei pela segunda hipótese, já que o Nuno me tinha garantido que aquilo estava «cheio de coisas boas». Levava comigo a lista do Pedro. Pesquisei de A a Z, e nada. Realmente aquilo está cheio de coisas. Basicamente as mesmas «coisas boas» que eu fui vender. «Olhe, afinal queria em dinheiro.» «Agora já não pode ser. Vá passando por cá, que todos os dias vamos recebendo coisas novas.», respondeu-me o empregado. Filipe
Ontem passei pela rua Guerra Junqueiro para aproveitar os restos dos saldos. A Guerra Junqueiro, em tempos um bastião do general Kaúlza, é hoje o último reduto do santanismo. Sem surpresa, vejo aproximar-se o deputado Gonçalo Capitão, acompanhado por duas dezenas de laranjinhas. Mudei logo de passeio. É nestas alturas que compreendo o Ivan: «Aproximar os eleitores dos eleitos»? Mantenham-se as distâncias, por favor. Filipe