Nestas eleições decidi tornar-me um cidadão responsável: fui ler os programas eleitorais de todos os partidos políticos. Nunca me considerei particularmente informado em questões políticas e, se é verdade que sempre votei (o que faz de mim um possível candidato a futuras eleições presidenciais), a minha ignorância das ideologias, da situação da fazenda portuguesa, dos manejos dos partidos ou da folha de serviços dos ministros chegava mesmo a ser escandalosa. Por exemplo, até há relativamente pouco tempo confundia o BE (Bloco de Esquerda) com o outro BE (Banco de España) e, pior, o PCP com o BCP. Uma vergonha!
Hoje sou uma pessoa diferente. Tenho 32 anos e posso dizer, sem hipérbole, que me sinto, pela primeira vez, optimista em relação ao futuro e ao lugar de Portugal no mundo. Basta ler os programas. Todos eles nos garantem que seremos felizes para sempre, que o paraíso terrestre está à distância de uma pequena cruz no boletim de voto. Consultar os manifestos eleitorais é quase como esfregar a lâmpada de Aladino: “Eu sou o vosso servidor. Fala, que desejas?”. Aumentar as receitas fiscais, sanear as contas públicas, reduzir o IRS, acabar com a evasão e a fraude fiscais, aumentar o investimento nas tecnologias, na investigação científica e no desenvolvimento sustentável, fazer crescer as exportações e o investimento estrangeiro, diminuir os custos da justiça, desburocratizar a administração pública, reduzir a sinistralidade, internacionalizar a cultura portuguesa, modernizar os museus, em suma, fazer de Portugal um dos 20 países mais competitivos do Planeta.Somados, os programas dos partidos totalizam 641 páginas (incluí, para que depois não me acusassem de desigualdade e discriminação no tratamento das diversas candidaturas, os programas do PCTP e do MPT). Foi uma leitura estimulante, épica, mais ou menos como ler de jacto o último livro de António Lobo Antunes, Eu Hei-de Amar uma Pedra (616 páginas). Todavia, ao contrário deste último, os programas eleitorais apresentam-nos uma escrita inspirada, desassombrada, com achados de estilo, como “futuro credível”, palavras sonoras, como “terricídio”, verbos inovadores e moderníssimos, como “implementar” ou “agilizar”, figuras de estilo com a ironia sempre pronta, como “tudo nos é oferecido numa bandeja de ilusões”. Enfim, na concepção dos pormenores, nas intervenções cómicas, nas sensações extremas, na imaginação desenfreada, estes programas fazem-nos lembrar livros como Utopia, de Thomas More, ou O Elogio da Loucura, de Erasmo de Roterdão.
João Pedro