No
Manchas, Luis Mourão pede-me explicações sobre o meu post de há dois dias:
«Meu caro Carlos Leone: se ao lado da Arendt de
Eichmann em Jerusalém colocar o Grass de
O tambor, acha que poderá manter a distinção entre um Grass
“vazio e retórico” e uma Arendt “analítica e séria”?» O ponto do meu post não era esse, mas não me custa responder e depois voltar ao meu tema (entretanto bem explorado também no
Da Literatura,
Abrupto,
Fuga para a Vitória e
O Amigo do Povo, pelo menos).
E a minha resposta é que não ponho as obras de Grass (romancista) e Arendt (filósofa) lado a lado, não me parece que sejam comparáveis. O que fiz foi comparar as declarações públicas de Grass, suposta autoridade moral, com uma reportagem para o «grande público» (ao menos maior do que o público específico de Filosofia). Isto é, comparei duas intervenções públicas.
Outra coisa: parece mais ou menos consensual que Grass continua a ser o grande escritor que até agora era. Mas o silêncio que caiu sobre as suas tiradas parece-me estranho. Se querem recusar a Grass a autoridade de as pronunciar, percebo (é a mesma lógica da atitude de Grass durante décadas...). Mas o que não vejo é ninguém manter as mesmas tiradas grandiloquentes e tremendas e essas deviam poder manter-se. Acho que quem gostava do civismo dele devia agora assumir como suas, sem recorrer ao facto de terem a marca de origem de Grass (agora desqualificado), essas lições de moral tão edificantes.
E com isto retorno ao meu ponto. O meu post era sobre o ódio à mudança que este caso (como tantos outros) revela. Daí a relação com o centenário de Marcelo, transformado pelas TV's em historieta de Verão. Permito-me estranhar tanta indignação com os alemães e tanto desinteresse face às nossas realidades. Mas como já disse acima (e já ontem deixei comentado no
A Terceira Noite) ainda bem que houve nos blogs quem não se satisfizesse com a «evocação» de Caetano.
Note que não me importo de escrever sobre Grass, embora não me motive muito. Em rigor, as suas observações no Manchas dizem muito do que eu diria sobre o tema do ponto de vista literário (aquele que deveria ser determinante, afinal). Espero que esta explicação tenha deixado mais claro o que me levou a escrever esse meu post. Há uns dias tive de discutir o que era fascismo quando tinha escrito sobre liberalismo e a nossa falta dele, agora sobre Grass quando escrevia sobre Caetano e o ódio à mudança... Enfim, deve ser dificuldade minha em explicar-me, obrigado por me ter chamado a atenção.
CL