Joga hoje, e como a Argentina está a perder o gás, não tenho problemas em voltar a torcer pela minha equipa de meninice (Portugal nunca lá chegava e o Brasil depois de 82 é aborrecido). Lembro-me do Magath, do Allofs, do Stielike, do Breitner, do Schumacher (esse animal), do Briegel (ganda façanhudo), do Litbarski e de tantos outros, sobretudo do meu homónimo Rumennigue, o maior (o mais velho, o mais novo era vulgarote). Já não tenho a certeza é de como se escreviam os nomes…Entretanto, a Filosofia fez-me trocar a certeza parmediana pela via dos mortais bicéfalos pós-tudo e mais qualquer coisa. Continuo a gostar mais de ginástica do que de futebol, mas é quase impossível ver, mesmo nas Olimpíadas, e não tenho com quem jogar xadrês. Volto à bola hoje para ver o belo trabalho desse grande avançado e grande desportista que hoje é um grande treinador, o saudoso «Kataklinsmann». E só tenho pena por o meu onze de sonho não estar disponível.
Baliza: na tradição alemã, um espalha brasas que se prejudica (mas não à equipa) pelo feitio, Schopenhauer. Sempre controverso, nunca têm a coragem de o deixar de fora.
Lateral direita: Carl Schmitt, valor seguro, polivalente, safa-se sempre dos cartões apesar do seu historial dúbio. Está a voltar a conhecer grande popularidade entre os adeptos.
Lateral esquerda: Adorno, jogador com escola (Frankfurt), primeiro de uma geração que conheceu um grande sucesso internacional.
Centrais: a dupla histórica, Marx e Engels. Conhecidos pelo materialismo impenitente do seu jogo, Karl joga a central de marcação e Friederich a libero. O primeiro é famoso na Bundesliga pelo seu poder de marcação, sempre atento às infiltrações da super-estrutura do jogo adversário. O segundo sabe que o futebol é infra-estrutura e se faz de trás para a frente, sai sempre a jogar, com grande espírito de equipa. Eles são a origem da família (desportiva), da propriedade (do fio de jogo) e do estado (dos títulos).
Trinco: Schleiermacher, um jogador discreto dentro e fora do campo, mas muito querido pela generalidade dos seus companheiros pelo papel conciliador que tem entre as diversas tendências presentes na sempre complexa selecção, apesar de disputas antigas com alguns colegas seus.
Médio centro: Hegel, cujo processo de jogo é de dimensões absolutas (segundos os seus fans) ocupa indiscutivelmente o lugar desde que o ex-capitão Lutero arrumou as botas. Os fans deste ainda não perdoaram ao seu sucessor ter dito que o homem moderno trocara a oração matinal pela leitura do diário matutino, mas talvez por isso a Imprensa é sempre respeitosa quando se refere às suas opções de jogo, tortuosas talvez, mas muito eficazes a desbaratar adversários históricos como os ingleses.
Extremo direito: Heidegger, muito forte no um para um graças às suas fintas de corpo, este jovem talento é contudo perseguido pelas suas afirmações e opções apressadas de início de carreira. Não obstante, a capacidade de fazer toda a ala ofensivamente e ainda auxiliar na defesa um jogador com processos tão diversos dos seus (Schmitt), dá-lhe hipóteses sérias de alcançar um lugar na história do ser jogador alemão.
Extremo esquerdo: Carnap, cuja conflitualidade permanente com Heidegger prejudica as permutas de flanco. Contudo, está muito bem integrado no processo mecanizado que é o jogo alemão, caracterizando as suas prestações por uma grande concentração na análise dos adversários, agressividade na luta a meio campo e capacidade de decisão através de jogadas individuais de contra-ataque.
Avançado centro e capitão de equipa: Kant, que mantém a braçadeira apesar das ambições de Hegel e de desentendimentos latentes com o seleccionador. Famoso pela sua frieza, que lhe vale a alcunha de hat-trick desde que atingiu a fama com três tentos críticos de impacte internacional, é um alemão atípico pela sua estatura e porte físico muito frágeis, mas não muito diverso nisso de outros grandes nomes (como Gerd Muller).
Segundo ponta: Nietzsche, indisciplinado e sem dúvida o mais talentoso da equipa, o mais latino de todos. Depois de muito se ter falado de uma possível perda de titularidade para um colega menos imprevisível e mais próximo do estilo de jogo de Kant (Gentz ou mesmo Blumenberg), acabou por merecer a confiança do treinador pelo pânico que infunde aos adversários, que não conseguem evitar recorrer à falta para o deter.
Suplentes: Fichte e Spengler (keepers); Horkheimer, Benjamin, Leibniz, Habermas (defesas); Jaspers, Feyerabend, Dilthey, Hempel (médios); Gentz e Blumenberg (avançados).
Treinador: Freud, mais ninguém dava conta do lugar.
CL