«Estive fora, do outro lado do rio Atlântico, durante Fevereiro e Março, mas ainda assim suponho não ter perdido nenhuma das polémicas que a vida da cultura nacional já engendrou este ano. A do Teatro Nacional, a do CCB/Berardo, a de um nome registado que não ouso grafar com João Pedro George e, agora, a da saída de Benard da Costa da Cinemateca. Vamos, se não me esqueci de nenhuma, na média de uma por mês.
As polémicas são sempre estéreis, muito barulho e depois fica tudo igual. Destas que notei, três são questões de opções do poder político governativo e só a que envolve João Pedro George é reveladora de algo intrínseco à sociedade civil, ao levantar o problema da liberdade de expressão. Que me lembre, este tipo de pressão só veio a público com esta nitidez quando António Guerreiro foi perseguido por um abaixo-assinado de ilustres democratas que queriam que Balsemão o despedisse do
Expresso por causa de uma crítica a um livro. Mas, pela minha experiência, pela do João Pedro George e por outras, é o tipo de pressão que acontece diariamente, bem mais significativa que as outras, limitadas pelos poucos recursos que o Estado (o Governo, sobretudo) permite que a tutela da Cultura disponha.
Ora, isto sugere uma alternativa: ou o ministério da Cultura não tem razão de ser, por faltar uma cultura que ele tutele, ou só vale a pena falar do ministério e não da cultura, pois isso é que interessa dada a falta de actividade cultural independente. Em qualquer caso, tal como o caso com Guerreiro, é do que não se fala que importaria falar. Critérios editoriais, decerto.»
Carlos Leone