Na revista
Sábado de hoje,
José Pacheco Pereira analisa um estudo da Marktest sobre a leitura de blogues (questão também debatida por
David Justino, no Quarta República) e coloca-lhe «sérias reservas» porque a recolha da amostra assentou em premissas erradas. Por exemplo, privilegiou as consultas de blogues feitas a partir de casa. Ora, qualquer bloguer sabe que os picos de audiência se verificam durante a semana e no horário de trabalho (com incidência nas horas de almoço, entre as 12h e 30m e as 14h, e no final da tarde, presumo que antes do regresso a casa). Aos sábados e aos domingos, sabe-se também, as audiências descem vertiginosamente. Logo, tudo indica que um estudo baseado num «painel de lares» será incapaz de captar e caracterizar a realidade.
Questões de métodos como estas são longamente discutidas em qualquer curso de sociologia que se preze. Durante alguns anos, na Faculdade, fui assistente da Professora Margarida Marques (hoje a maior especialista portuguesa em questões de imigração) numa cadeira de Teoria e Métodos para as Ciências Sociais. Um dos exemplos discutidos nas aulas sobre como não construir uma amostra era o seguinte: a revista
Digest, na década de 1920, fez diversas sondagens para as diferentes eleições presidenciais americanas desse período. O inquérito foi feito por telefone e os nomes da amostra foram obtidos através da lista telefónica e das listas de registo automóvel. O que queria dizer que quem não tivesse telefone ou automóvel estava, à partida, excluído da amostra: apenas as classes médias e as classes altas (nessa altura, como calculam, nem todos tinham telefone em casa ou possuíam automóvel) é que foram abrangidas pelas sondagens. O método de recolha da amostra carecia, pois, de validade. Dito de outro modo, procedeu-se a extrapolações para uma população que não estava representada na amostra.
Outro exemplo referia-se a uma sondagem sobre «interesse pela política» e tinha como população-alvo os agriculturos franceses. O estudo chegou à conclusão que os agricultores franceses eram apolíticos e que pouco ou nada se interessavam por política: quando confrontados com a pergunta «A política interessa-lhe?», os agricultores, na sua maioria, respondiam «Não» ou «Nada». Simultaneamente, verificou-se que a participação eleitoral dos agricultores era altíssima. Havia, portanto, uma contradição entre os resultados da sondagem e os posteriores resultados eleitorais. Até que se percebeu que o problema residia na forma como os agricultores tinham interpretado a pergunta, que na verdade era vaga e imprecisa, o que explica o erro de interpretação. Julgavam eles que «interessar-se por política» significava «aderir a um partido», ideia que era veementemente rejeitada pelos agricultores franceses.
Pormenores como estes fazem toda a diferença e exigem dos técnicos uma atenção rigorosa de forma a assegurar a fidedignidade e a validade das medidas. Foi isso, aparentemente, que faltou ao estudo da Marktest. E, a ser assim, continuarei a guiar-me pelo «velho»
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