Caro João Pedro George:
Aqui lavro, veemente, o meu protesto. Não tenho tido um dia de descanso, desde que você, devidamente acolitado por um Pedro Mexia, mais uns engraçadinhos da blogosfera, decidiram dar à estampa pública as assanhadas descrições nascidas dessa mente tortuosa, que mete ao barulho sopas do mar, monstruosas erecções e uma quimera respeitável como a de Colombo.
Acontece, por infortúnio e coincidência, que me chamo Lena e o meu passaporte confirma: nasci na Escandinávia. Os genes, como se não bastasse, dotaram-me de características quase caricaturais. Leia-se: gosto de trazer o cabelo loiro comprido, o que o faz precipitar-se-me encaracoladamente sobre os ombros, e sim, apesar de não vislumbrar vestígios de chupeta nas pontas, os meus seios desafiam a elasticidade de qualquer tecido.
Que se passa, então, desde que iniciaram as graçolas? Não posso sair à rua sem ouvir dichote. Lambem-me com os olhos velhos na fila do supermercado, atiram-me indecências várias os trolhas nos andaimes. Senhoras respeitáveis, deambulando pela FNAC, medem-me as mamas com indisfarçável descaramento. Grupos de adolescentes borbulhentos ultrapassam-me no passeio, para se voltarem para trás e fingirem tossir, enquanto riem e gritam uns aos outros: sopa de peixe. Agora multiplique. Estamos a falar, é bom que não esqueça, de cerca de 70 mil exemplares vendidos, meu caro. And counting.
Acresce, se me permite, que você falha o essencial. O
Codex apresenta-se como ficção histórica, definição que esconde veleidades de caução no real. Ora o que lemos cinge-se à mais pura inverosimilhança. Qualquer mentecapto percebe que Tomás, o garboso historiador, não é mais que um alter-ego de Dos Santos, disfarçado com a mesma eficácia dos pais de Woody Allen nas suas máscaras com bigodes em
Inimigo Público. A ser assim, ler Tomás é ver Dos Santos. E aqui reside o embuste. Não será de admirar que, após a leitura atenta e assombrada das aventuras do historiador maroto, milhares de rapariguinhas a soldo dos primeiros desarranjos hormonais sintam com nova esperança aquele piscar de olho com que Dos Santos se despede de nós no Telejornal.
Puro engano, engodo feio. Pois aqui concordo consigo. O Santos, como o Miller e outros que tais, gosta de encaralhar no papel para esquecer tanta sarapitola angustiada. Vingança, talvez, de moças que fingiram gemer debaixo deles, perdem-se deliciados na imaginação de possuírem respeitosos pénis marmóreos, de avermelhados veios.
E, no entanto, parece que o vejo a brandir-me a minhoca em frente ao peito. Evito a punheta de mamas, que não gosto de apertar cabeças de dedal. E estou com a Anaïs. Não me quer parecer que adiantassem muito esforços de o abrigar cá dentro. Chame-me céptica, mas não pressinto por ali estocada que me faça cócegas no fundo da rata.
Não o maço mais. Mas culpe-se com o resultado. Vou cortar o cabelo pela orelha, tingi-lo de negro e responder Ingrid a quem me perguntar o nome. No meio de tanta mama, sopa, fremência de pénis, esporradela e idosos que me apalpam o cu de livro debaixo do braço, fiquei um bocadinho sem perceber: o Colombo era português ou quê?
Sua, Lena