Os portugueses não gostam que se «diga mal» de nada e desconfiam de quem diz. «Dizer mal» de um livro, de uma escola, de um hotel ou de uma política é sempre considerado um «ataque» de pessoa a pessoa e atribuído aos piores motivos: à inveja, à cobiça, ao ressentimento e por aí fora. Não ocorre a ninguém que «dizer mal» do livro não implica «dizer mal» da pessoa privada do escritor (...).
(...) «dizer mal» é uma condição indispensável para produzir bem e obrigatória para produzir melhor. No hábito de «dizer mal» do que nós fazemos e do que os outros fazem reside a essência da capacidade de aperfeiçoamento e, por conseguinte, de competição. E o Dr. Cavaco quer um país que «não diga mal» e que ao mesmo tempo seja capaz de competir. No fundo, o Dr. Cavaco não sabe o que quer.
Vasco Pulido Valente, "Elogio da Maledicência",
Esta Ditosa Pátria, Lisboa, Relógio d'Água, 1997, pp. 82-85.