Não acompanho o motociclismo nem o Dakar. Aliás, vendo bem, não acompanho qualquer desporto motorizado desde que Eddie Lawson e Alain Prost abandonaram, à vez, as suas carreiras. Fabrizio Meoni é, portanto, um nome que pairava naquela vaga nuvem de palavras que já ouvimos, mas a que não vem anexada qualquer imagem. Até ontem.
Não sei se ele era boa ou má pessoa, divertido ou soturno, se tinha cinco filhos a quem ensinou a andar de bibicleta ou era, pelo contrário, um misantropo crónico. Não faço ideia. Mas acredito que morreu como gostaria de morrer. Pilotando uma moto, durante a prova que ganhou por duas vezes, a meio do deserto que conquistou também nas areias do Egipto e da Tunísia. Porque é assim que se deve morrer, sendo fiéis a nós próprios, morrer como se viveu e não apodrecendo na cama de um hospital qualquer, esquecidos do que fomos, com tempo demais para para pensar naquilo que se falhou.
Vêm, de imediato, à memória, Ayrton Senna, ao volante do seu fórmula 1, em San Marino; Mikklos Féher, na frente de ataque do Benfica, em Guimarães; Mark Sandman, vocalista dos Morphine, caído em palco durante um concerto na Holanda. E a frase com que a personagem de Kiefer Sutherland abre, diante de uma manhã gloriosa, o belo “Flatliners”, de Joel Schumacher: “Hoje, é um bom dia para morrer.”
Também não vi jogar Cavém, excepto, talvez, nas imagens documentais da década de 60 que todos revemos quando se quer homenagear o futebol português. Mas lamento que um bi-campeão europeu, nove vezes campeão nacional, quatro vezes vencedor da taça de Portugal, tenha de ser levado pelo Alzheimer, de uma ala do Hospital de Leiria. A única forma justa deste homem morrer era erguendo uma taça.
AB