A Fórmula 1, como desporto, já não existe. Há anos que não existe. Servirá para os meninos ricos brincarem, para as marcas fazerem publicidade, para a indústria automóvel desenvolver protótipos, para os mecânicos exibirem a sua perícia e tentarem pulverizar, consecutivamente, o recorde da mudança mais rápida de um jogo de pneus. Nada mais. Como competição, como desafio, expectativa, imortalização e crucifixão de heróis, não serve para nada. Não tem paixão nem dúvida nem surpresa nem invenção. É pouco mais que geometria.
Não acredito que o próprio Schumacher não o sinta, não o tenha por absolutamente certo. Que o seu lugar na História não tem o sabor que sonhara em miúdo, vendo correr os seus ídolos. Onde estão os Mansell, os Prost, os Senna, Piquet, Alboretto, Lauda e por aí adiante? Schumacher tem um olho em terra de cegos; é uma espécie de Zidane a jogar no Desportivo de Mafamude; a beleza onde não existe ninguém para a contemplar e invejar.
Agora, chegou Tiago Monteiro. Regressa um português às pistas dos 300 km por hora, com carros esquisitos e motores ensurdecedores. Vem depois de Nicha Cabral, Pedro Matos Chaves, Pedro Lamy. E está na Jordan, uma equipa melhor do que aqueles tiveram ao seu tempo. Também cumprirá um sonho de criança, também terá visto os Prosts e os Sennas e sonhado ser como eles. Mas também saberá que vai correr a meio de um cemitério - a infância da arte automóvel, mas, do ponto de vista humano, um cemitério.
Noutro tempo, vibraria com a notícia e ficaria ansioso pelo início do campeonato. Hoje, tudo o que posso fazer é prometer que voltarei a tentar ver um grande prémio. E desejar que Tiago desiluda o menos possível os projectos que tinha quando era menino.
Alexandre