Só posteriormente notei que, na nossa edição de domingo, dia de eleições [A CAPITAL de uns já idos de Fevereiro], ainda por cima, uma classe de pessoas dominava o jornal e não era, surpresa das surpresas, a classe política. Da página 4 à 12, estendíamo-nos por uma conversa singular entre Pacheco Pereira e Eduardo Lourenço. Pouco depois, no balanço da semana cultural, dois nomes pairavam sobre os dias: José Gil e António Franco Alexandre. Que une todos eles? A Filosofia. São todos filósofos, portugueses, contemporâneos, de méritos reconhecidos. Algum deles tem poder? Poder real, efectivo, imediato, pragmático? Não. Zero. Todos são professores, escritores, livres-pensadores, como agora se diz.
Por um lado, muito me honra que tenhamos sabido estar atentos à importância destas figuras. No mesmo sentido, alegra-me que quatro filósofos sejam tão relevantes e dignos de louvor e atenção pública. Por outro, tomo, de modo inadvertido, mais um banho de realidade: a filosofia, o pensamento livre, a reflexão pura, distanciada do mundo, não tem lugar nas cadeiras do poder.
O sonho platónico do rei-filósofo morreu com o sangue da Revolução Francesa. Depois de Kant, só Hegel foi capaz de ainda delirar com a ilusão de que as sociedades, alguma vez, seriam comandadas pela pura razão e, desde logo, pelos homens mais capazes dela.
O tempo seguiria outros caminhos. A filosofia não põe pão na mesa – pois claro que não – essa é a sua maior virtude: não servir para rigorosamente nada em concreto, porque deveria servir todos e estar inscrita na génese de todas as coisas.
Mas o mundo não compreende isto. Como Nietzsche, símbolo dos desiludidos, bem escreveu, é a vontade de poder que movimenta o devir. E os sábios sempre desprezaram o poder. E o poder sempre gostou de sábios para servir de bibelot, colocados na estante, para aparecerem atrás de si, nas fotografias.
O resto, caro leitor, é conversa.
Alexandre