Desde pequeno que oiço dizer: “De quem não tem vergonha, todo o mundo é seu.” Todos os dias a frase me parece mais acertada. Foi sempre assim. Há um poder estranho na audácia dos desavergonhados que nos desarma; ultrapassa a razão e, por isso mesmo, nos deixa sem argumentos. Pensem em como é mais complicado discutir com um ignorante do que medicina com um médico ou ciência com um cientista - não dá, não é possível. O desavergonhado contradiz-se ao seu bel-prazer, de um minuto para o outro; questiona tudo, até o estarmos ali, se for preciso; ao mesmo tempo, tem certezas absolutas de coisas que estão, inevitavelmente, “cientificamente provadas”, conforme lhe dê jeito; não reconhece uma única fonte de verdade do nosso discurso e por aí afora. No fim da conversa, sai, como é obvio, vencedor, de queixo erguido, todo inchado, perante o nosso desespero. Poucas coisas nos alteram tanto o batimento cardíaco e a nossa posição humanista sobre os maus tratos ao próximo como isto.
Ao assistir às peças noticiosas sobre a campanha eleitoral ou pré-campanha ou o que lhe quiserem chamar, é esse sentimento de impotência que me assalta. Sinto-me trancado num manicómio, tentando dialogar com autistas e esquizofrénicos. Um está convencido de que é o Napoleão; o outro de que é o Humphrey Bogart; o outro de que ainda vivemos o tempo da queda dos Czars; enfim… E, no meio da loucura, da total ausência de vergonha na cara, estarão convencidos, mais do que do esquecimento do povo, da verdade da sua própria mentira.
Como não sei dialogar com eles, dia 20 respondo só com uma cruz, uma cruz a todo o tamanho do boletim de voto, uma cruz da qual espero que nenhum deles ressuscite nem ao terceiro dia ou nem ao quadragésimo.
Alexandre