É uma coisa genética, não tenho a culpa. Já a minha mãe não gostava, nem o meu pai, nem o avô, nem o bi e o tri, a amante dele, o periquito, a vizinha da frente. Tentei contrariá-lo, ainda arranjei, em miúdo, daqueles narigões com óculos e bigode à Chalana, chapéus e cornetas, cabeleiras, meia-dúzia de máscaras.
Em adolescente, confesso, houve um ano em que aderi àquela coisa ridícula a que todos os homens acham sempre muita piada e tremendamente original: vestir-se de mulher, aliás, de mulher feia, histérica e de mau gosto. Depois, borrifei na indumentária, mas continuei a ir às discotecas nessas noites de tragédia. Piorou: sem máscara nem conseguia disfarçar que as minhas faces mudavam de cor a cada vez que começava a ouvir-se uma nova brasileirada (fenómeno extensível às passagens de ano, gostaria de saber porquê…). Letras metafísicas sobre a identidade da cachaça e da água, o laço de amizade que nos une a Charlie Brown e um épico hino a uma cidade-maravilhosa-coração-do-meu-(Meu?!?!?!)-Brasil… Enfim, haverá sanatórios onde se dizem coisas com mais nexo.
O tempo passou. Tudo bem. Decidi que essas seriam as únicas noites do ano em que não sairia de casa por dinheiro nenhum e vislumbrei a única virtude da época: a sua efemeridade. Só dura dois dias. Ou três, ou o que é. Depois, a civilização voltava à normalidade e ninguém falava mais no assunto até ao ano seguinte. Uma questão de higiene.
Mas 2005 reservou-me esta surpresa: campanha eleitoral e Carnaval juntos porque, como dizem os anglo-saxónicos, “misery likes company”. O fenómeno é tal que até Alberto João trocou o desfile no Funchal por um passeio pelo País ao lado de Santana. E, de repente, a vida que durava dois dias tem de ficar ligada à máquina até ao próximo dia 20, em estado de morte cerebral. Há dias em que a eutanásia deveria ser obrigatória.
Alexandre