O homem teria à volta de cinquenta anos e tinha bom aspecto. Saíu à minha frente da pastelaria e virámos os dois à direita para descer a rua. Eu ia uns passos atrás dele. São poucos metros até ao cruzamento com a minha rua, onde tenho de virar à direita. Enquanto caminhava atrás dele reparei que tinha as costas do blusão todas sujas, sujas do que pareciam ser pegadas de pó. Ele parou no cruzamento à espera de atravessar e eu ia-me aproximando. Era muito estranho o facto de ele estar perfeitamente bem vestido, bem penteado, ter bom aspecto, sapatos limpos e cuidados, mas ter um blusão completamente sujo de um sujo ainda por cima esquisito. Era como se alguém tivesse estado repetidamente aos pulos em cima do blusão com botas das obras. O tipo não pode não ter reparado nisso, pensava. Estamos juntos no cruzamento, eu viro à direita e ele olha pela última vez para um lado e para o outro antes de atravessar. Olhou para a esquerda e depois para a direita. Aí, ficámos a olhar um para o outro por um segundo. Eu achei que se olhasse para a cara dele ia perceber. Nada, não cheguei a perceber o porquê. Fiquei embaraçado por sentir em mim o embaraço que ele não sentia. Fiquei embaraçado por ele, como quando via o «Perdoa-me». Estive quase para lhe dizer olhe, tem o blusão todo sujo atrás, mas, por pudor, não disse. Rui