Desde adolescente que tenho uma tendência estranha. (Calma, Mãe, não vou dizer nada que tu não queiras ouvir…) Amiúde, oiço temas musicais por que me apaixono e penso: "No dia em que fizer um filme, tenho de o acabar com esta música…" E logo imagino a sequência final, o último plano, em open-up interminável, a entrada dos créditos finais, o subir do volume do tema em causa.
Porque é que confessar isto é embaraçoso? Porque nunca fiz qualquer filme. E as possibilidades de o vir, ainda, a fazer não pairam, assim, tão próximas daqui. Escrevi duas curtas-metragens, uma para uma produtora que faliu antes de a realizarmos e outra para o ICAM correr com o mesmo comentário crítico das outras 300 não subsidiadas.
Mesmo assim, sendo apenas texto, esses dois guiões estavam já pejados de referências a canções. Deliro de tal maneira com as bandas sonoras que gostava que as nossas próprias vidas tivessem uma, como se uma das secções do cérebro estivesse reservada para a mesa de um superego DJ.
Ontem, recordei uma dessas faixas-perfeitas-para-finalizar-filmes, "Life In A Glasshouse", o último tema de "Amnesiac", Radiohead. E, indo para casa de táxi, sintonizado no RCP, apercebi-me de outra, mais inesperada: "Cavalo À Solta", Fernando Tordo a cantar Ary dos Santos, embora a recente versão da Mafalda Arnaut seja ainda mais interessante.
Imaginem lá: as casas, as praças, os anúncios, as pessoas a passar pela janela, alguém que parte, o protagonista abandonado na plataforma da estação. E vai-se ouvindo, baixinho, em crescendo: "minha laranja amarga e doce, meu poema (…) minha coragem de correr contra a ternura…"
Alexandre