Talvez por inspiração da literatura gótica ou do cinema de terror, habituámo-nos a esperar que o mal se apresente de modo monstruoso. Que se configure na forma de um gigante hediondo, com múltiplos braços e intermináveis pernas, de corpo disforme e rosto repugnante. Habituámo-nos a esperar que ele se anuncie e denuncie numa gargalhada maquiavélica, acompanhada, em fundo, da típica banda sonora do perigo.
Por outro lado, temos o imaginário cristão. Através dele aprendemos que a hipóstase do mal, o Diabo, Lucifer, o anjo caído que antes era o preferido de Deus, é lindíssima, quase tão bela quanto o Criador, pouco distante da perfeição divina.
Mas a realidade não é assim. Nem de uma forma nem de outra. Se pensarmos bem sobre a História, os maus não são extraordinariamente feios nem belos. Aliás, eles só são maus porque não sabemos onde estão, porque se confundem com os outros, com a normalidade, o bem, o inofensivo. Na hipocrisia da sua trama, conquistam espaço, em silêncio, para o seu poder. Rastejando, insinuando-se, lentamente, dia após dia, com paciência e método, como as serpentes. Quando se erguem e, enfim, revelam o seu rosto demoníaco, é já demasiado tarde: estão enroscados ao nosso tronco, amarrando as nossas mãos, preparados para nos lançar o seu veneno.
O mundo acontece assim. O futuro próximo poderá revelar novas configurações do mal que comprovem esta tese. E mesmo entre nós, do lado de cá dos baixos muros lusos, estes seres rastejantes fazem o seu caminho. Não são belos nem feios, não parecem oferecer grande perigo, quase se tem pena deles. Lá dentro, no entanto, no arquitectar dos seus pensamentos, o desejo que os corrompe é o mesmo de que falavam, figurativamente, as Escrituras: a ganância.
Já Baudelaire o dizia, de modo magistral: “A maior artimanha do Diabo é a de nos persuadir de que não existe.”
Alexandre